A Biblioteca de Paris, de Janet Skeslien Charles, é uma belíssima história ambientada nos anos 30 do século XX. Os fatos narrados nessa história ocorrem em um momento muito sombrio da história humana, a Segunda Guerra Mundial. O romance foi publicado em 2020 e tem muito da própria experiência da autora que trabalhou por algum tempo na Biblioteca Americana de Paris. As vivências da autora nesse ambiente histórico acabam por atribuir à narrativa grande veracidade e dão à leitura um caráter mais verossímil e palpável.
“Eu amava Paris, uma cidade com segredos. Como capas de livro, algumas de
couro, outras de pano; cada porta parisiense levava a um mundo inesperado.
Um pátio poderia conter um emaranhado de bicicletas ou uma concierge
corpulenta armada com uma vassoura”.
Resenha de A biblioteca de Paris
A história inicia-se em 1939, em Paris, quando a protagonista do livro, Odile Souchet, consegue um emprego na biblioteca americana de Paris. O sonho de Odile sempre foi trabalhar nessa biblioteca, pois lá poderia exercer todo o seu amor pelos livros. Ela se encanta pelo trabalho, pelo ambiente da biblioteca e pelos amigos que faz. Logo depois, Odile conhece um rapaz chamado Paul por quem se apaixona. Sua vida, assim, está caminhando muito bem, até que tudo muda.
“Eu adorava estar cercada por histórias, algumas velhas como o
tempo, outras publicadas no último mês”.
A chegada dos alemães
A jovem bibliotecária vê sua rotina tão feliz totalmente transformada quando a França é invadida pelas forças alemãs e a guerra chega a Paris. Embora haja a ameaça de fechamento da biblioteca, ela permanece aberta mas sob o controle dos nazistas. Alguns livros são proibidos de circular devido ao conteúdo considerado subversivo pelos alemães e os judeus são proibidos de frequentar a biblioteca. Odile e os outros bibliotecários, porém, criam formas de burlar essas ordens e resistir como podem ao controle dos invasores.
Para quem ama livros, essa é uma parte bastante emocionante, pois os livros tornam-se as armas com as quais os bibliotecários lutam contra a opressão que lhes é imposta. E isso se torna ainda mais significativo quando sabemos que é um dado real, pois, durante a ocupação alemã na França, de fato, os funcionários da biblioteca resistiram ao domínio nazista, possibilitando que as pessoas continuassem a ter acesso aos livros, inclusive os judeus.
Dois tempos narrativos: 1939 e 1983
A história de A biblioteca de Paris ocorre em dois tempos, e espaços, narrativos: 1939, em Paris, e 1983, em Montana, nos Estados Unidos. Nesse segundo tempo da narrativa, Odile é uma senhora já e mora sozinha e um tanto reclusa até que conhece uma adolescente chamada Lily, uma menina curiosa e apaixonada por livros e aventuras.
Lily fica muito intrigada com aquela senhorinha misteriosa, da qual pouco se sabe, e procura se aproximar dela. Acaba descobrindo muitos interesses em comum com a vizinha e elas se tornam amigas.
Considerações sobre A biblioteca de Paris
Um dos pontos positivos do livro é a forma como a autora retrata o valor da literatura e das bibliotecas como fontes de esperança e resistência. A história também aborda temas como amizade, coragem e a importância de preservar a cultura e o conhecimento. Através das personagens, somos levados a refletir sobre a força da união e da solidariedade em momentos difíceis.
Embora boa parte da história se passe em uma época bastante triste da história humana, com muita violência e acontecimentos terríveis, o foco da obra é colocado sobre aspectos muito mais felizes como a solidariedade, a bondade, a amizade, o amor e a esperança. Em vários momentos, é possível ver pessoas que se dispõem, inclusive, a correr risco para ajudar outras e levar, através do livros, um pouco de conforto em situações tão adversas.
Outros pontos interessantes do livro ficam por conta das referências a outras obras da literatura, pois muitos autores e trechos de livros famosos são citados no decorrer da trama. Como o trecho a seguir em que Odile procura na biblioteca um livro para o irmão e acaba por encontrar o famoso romance Drácula, de Bram Stoker.
“Eu nunca julgava os livros pelo começo. Era como o primeiro e último
encontro que tive, nós dois sorrindo demais. Não, eu abria em uma página
no meio, onde o autor não estava tentando me impressionar. “Há escuridões
na vida e há luzes”, li. “És uma das luzes, a luz de todas as luzes.” Oui.
Merci, Mr. Stoker”.
Há também a alternância de narradores. Ainda que a narradora do livro seja a própria protagonista, Odile, em alguns momentos, outros personagens assumem temporariamente a narração. Isso garante dinamismo ao enredo e permite que o leitor veja os acontecimentos por outras perspectivas.
Concluindo…
A escrita de Janet Skeslien Charles é envolvente e cativa o leitor, fazendo com que nos sintamos imersos na história e nas emoções das personagens. A autora também faz um excelente trabalho ao retratar a atmosfera da época, transportando-nos para as ruas de Paris durante a guerra.
A Biblioteca de Paris é um livro que combina ficção histórica, romance e drama. Um livro que tem como contexto principal a Segunda Guerra Mundial, o que dá ao livro a caracterização de romance histórico, mas é muito mais um livro sobre bibliotecas, sobre o amor aos livros e o poder de resistir à opressão através deles, e um livro sobre a amizade e a solidariedade.
“— Sou Odile Souchet. Desculpe o atraso. Cheguei cedo, mas abri um
livro…
— Ler é perigoso — disse Miss Reeder com um sorriso sapiente. —
Vamos para a minha sala”.
Veja mais sobre essa obra, como a sinopse, trechos escolhidos pelos leitores e valor do livro aqui. Além disso, você pode gostar também do artigo sobre outra obra que também fala sobre uma biblioteca, A biblioteca da Meia-Noite, de Matt Haig, um dos livros mais vendidos de 2023.
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