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Modernismo 1ª Geração: principais autores e obras

  • Samira Mór 

A 1ª Geração do Modernismo brasileiro ocorreu entre 1922 e 1930 e foi marcada pela renovação da linguagem literária e pelo rompimento com as formas artísticas tradicionais.

A princípio, causou espanto e até mesmo uma certa aversão por parte da elite da época acostumada às óperas e exposições da chamada arte acadêmica.

A Semana de Arte Moderna, ocorrida no Theatro Municipal de São Paulo em fevereiro de 1922, é considerada o marco inicial do Modernismo.

Theatro Municipal de São Paulo.
Theatro Municipal de São Paulo

O ano de 1922 marca, portanto, o início da chamada 1ª Geração do movimento que perdurará até 1930. Veja a seguir o contexto, as principais características e obras dessa geração e os autores que se destacaram.

Contexto histórico da 1ª Geração do Modernismo

O Modernismo brasileiro surgiu em um período conturbado da história, tanto no Brasil quanto no mundo. Era o chamado entreguerras, ou seja, o período entre as 1ª e 2ª Guerras Mundiais.

No Brasil, vigorava a Primeira República, ou República Velha, que terminaria em 1930 com uma revolução que colocaria Getúlio Vargas no poder.

Fptografia da cidade do Rio de Janeiro no início do século XX
Avenida Rio Branco, no Rio de Janeiro, início do século XX

Além disso, outras revoltas ocorreram no período, manifestando a insatisfação com o governo e com a política. Essa política alternava no poder líderes de Minas Gerais e de São Paulo, tanto que ficou conhecida como “Política do Café com Leite”.

A imigração se intensificara desde os anos finais do século XIX e estrangeiros, em sua maioria italianos, vinham para o Brasil em busca de riqueza. No entanto, a mão de obra desses imigrantes acabava sendo absorvida nas lavouras de café no interior de São Paulo.

Ou ainda nas fábricas e no comércio da cidade. A cidade de São Paulo alcançava grande crescimento com a industrialização e a urbanização da cidade se intensificou.

Fotografia da cidade de São Paulo no início do século XX.
Cidade de São Paulo, início do século XX

Boa parte da população brasileira ainda vivia em regiões rurais e era comandada pelos fazendeiros, chamados coronéis.

Ainda assim, a modernidade se anunciava como um grito contra o passado. A arte tradicional não expressava mais o momento e os artistas começaram a vê-la como velha e ultrapassada. Era preciso uma arte nova, moderna, antenada com as inovações do presente.

Os oito anos da 1ª Geração modernista foram bastante conturbados, portanto. E esses anos nos legaram grandes obras artísticas e grandes artistas também.

Características do Modernismo da 1ª Geração

  • Rompimento com a tradição e negação do passado;
  • Novas formas de arte inspiradas nas Vanguardas Europeias, principalmente o Futurismo, o Cubismo e o Surrealismo;
  • Nacionalismo crítico e busca da identidade brasileira;
  • Verso livre, oralidade, coloquialismo e prosaísmo;
  • Valorização da língua nacional e do modo de falar cotidiano;
  • Alegria, comportamento irreverente, ironia e deboche;
  • Poema-pílula (poucos versos e curtos) e poema-piada.

Os anos após a Semana de 22

Os anos que se seguiram à Semana de 1922 revelaram discordâncias entre os modernistas da 1ª Geração.

Parte desses artistas defendiam que a arte brasileira deveria se caracterizar por motivos totalmente nacionais e recusar qualquer influência exterior.

Outra parte entendia que era possível negar a presença da cultura estrangeira dentro da nossa própria cultura e que se poderia criar uma arte brasileira a partir das influências externas.

Revista klaxon, um dos meios de propagação das ideias e obras modernistas
Revista klaxon, um dos meios de propagação das ideias e obras modernistas

Surgiram, então, dois grupos: o grupo da Anta, extremamente nacionalista e liderado por Plínio Salgado; e o grupo da Antropofagia, liderado por Oswald de Andrade e que, como o próprio nome do movimento expressa, admitia a cultura estrangeira como base para a produção de uma arte verdadeiramente brasileira.

Principais autores da 1ª Geração do Modernismo brasileiro

A 1ª Geração modernista era composta por vários artistas de grande valor. Dentre eles, três se destacaram: Oswald de Andrade, Mário de Andrade e Manuel Bandeira.

Oswald de Andrade (1890-1954)

Oswald de Andrade era poeta, contista, dramaturgo e romancista. E um grande pensador de nossa cultura e brasilidade.

Fotografia do poeta Oswald de Andrade.
Oswald de Andrade

A poesia de Oswald apresenta as características propostas pelo Modernismo: liberdade e inovação formal; crítica social; nacionalismo crítico; oposição à arte tradicional; muito humor e ironia; metalinguagem; deboche da vida burguesa.

As meninas da gare

Eram três ou quatro moças bem moças e bem gentis

Com cabelos mui pretos pelas espáduas

E suas vergonhas tão altas e tão saradinhas

Que de nós as muito bem olharmos

Não tínhamos nenhuma vergonha

O poeta liderou dois movimentos importantes da poesia da época: o Movimento da Poesia Pau-Brasil e o Movimento da Antropofagia.

“Só a ANTROPOFAGIA nos une. Socialmente. Economicamente. Filosoficamente.

Única lei do mundo. Expressão mascarada de todos os individualismos, de todos os coletivismos. De todas as religiões. De todos os tratados de paz.

Tupi, or not tupi that is the question”.

Oswald de Andrade também escreveu romances, como Os Condenados e Memórias Sentimentais de João Miramar e peças de teatro, como O Rei da Vela. Além de ensaios, memórias e manifestos.

Memórias sentimentais de João Miramar

Romance escrito em capítulos curtos e de forma fragmentada. Narra, de forma biográfica, em 1ª pessoa, a vida de João Miramar, um burguês paulistano que tem uma vida banal.

60. Namoros

Vinham motivos como gafanhotos para eu e Célia comermos amoras e moitas de bocas.

Requeijões fartavam mesas de sequilhos.

Destinos calmos como vacas quietavam nos campos de sol parado. […]”

Oswald de Andrade. Memórias Sentimentais de João Miramar.

O livro é uma sátira à sociedade burguesa e, em muitos momentos, faz lembrar outra obra famosa de nossa literatura, Memórias póstumas de Brás Cubas. O próprio título das obras já nos leva a perceber o jogo paródico de Oswald.

Mário de Andrade (1893-1945)

Grande pensador de nossa cultura e folclore e um apaixonado pela cidade de São Paulo, a obra de Mário de Andrade se divide em poemas, contos, crônicas, romances, ensaios.

Sentimentos em mim do asperamente

dos homens das primeiras eras…

As primaveras de sarcasmo

intermitentemente no meu coração arlequinal…

Intermitentemente…

Outras vezes é um doente, um frio

na minha alma doente como um longo som redondo…

Cantabona! Cantabona!

Dlorom…

Sou um tupi tangendo um alaúde!”

Sua poesia compreende textos voltados para o folclore brasileiro e a vida rural e cotidiana e para a cidade de São Paulo.

Fotografia do escritor Mário de Andrade
Mário de Andrade

Sua obra em prosa mais significativa e um dos romances mais importantes de nossa literatura é Macunaíma – O herói de nossa gente.

Macunaíma

O romance Macunaíma pode ser considerado uma paródia dos romances indianistas românticos. O protagonista do livro é um indígena da tribo amazônica tapanhumas com características bem diferentes das dos indígenas criados por José de Alencar.

Oberve essa diferença e a paródia do romance indianista romântico, comparando os dois trechos a seguir. O primeiro é o início do romance Iracema, de José de Alencar. O segundo, o início de Macunaíma. Ambos tratam do nascimento e da apresentação dos protagonistas de ambas as obras.

Iracema X Macunaíma

“Além, muito além daquela serra, que ainda azula no horizonte, nasceu Iracema. Iracema, a virgem dos lábios de mel, que tinha os cabelos mais negros que a asa da graúna e mais longos que seu talhe de palmeira. O favo da jati não era doce como o seu sorriso; nem a baunilha rescendia no bosque como seu hálito perfumado. Mais rápida que a ema selvagem, a morena virgem corria o sertão e as matas do Ipu, onde campeava sua guerreira tribo, da grande nação tabajara. O pé grácil e nu, mal roçando, alisava apenas a verde pelúcia que vestia a terra com as primeiras águas”.

José de Alencar, Iracema.

No fundo do mato-virgem nasceu Macunaíma, herói de nossa gente. Era preto retinto e filho do medo da noite. Houve um momento em que o silêncio foi tão grande escutando o murmurejo do Uraricoera, que a índia tapanhumas pariu uma criança feia. Essa crianç a é que chamaram de Macunaíma.

Já na meninice fez coisas de sarapantar. De primeiro passou mais de seis anos não falando. Si o incitavam a falar exclamava:

– Ai! que preguiça!…”

Mário de Andrade. Macunaíma.

Macunaíma é obrigado a deixar sua tribo e também a própria mata e embarcar em uma viagem cheia de aventuras para São Paulo. Ele sai em busca de uma pedra valiosa que representa as suas origens, a muiraquitã.

Macunaíma é um anti-herói, de caráter ambíguo, e uma representação do povo brasileiro. Mário de Andrade busca construir uma personagem que, através da compilação de mitos e lendas, comportamentos, expressões populares, represente e encarne o brasileiro.

Manuel Bandeira (1886-1968)

O poeta Manuel Bandeira tem uma história de vida que impressiona. Aos dezessete anos, recebeu um diagnóstico de tuberculose que limitou sua vida e o impediu de formar-se arquiteto e casar-se.

Provinciano que nunca soube

Escolher bem uma gravata;

Pernambucano a quem repugna

A faca do pernambucano;

Poeta ruim que na arte da prosa

Envelheceu na infância da arte,

E até mesmo escrevendo crônicas

Ficou cronista de província;

Arquiteto falhado, músico

Falhado (engoliu um dia

Um piano, mas o teclado

Ficou de fora); sem família,

Religião ou filosofia;

Mal tendo a inquietação de espírito

Que vem do sobrenatural,

E em matéria de profissão

Um tísico profissional.

No entanto, foi um grande estudioso da cultura clássica e brasileira e compôs uma poesia vasta e admirável.

Fotografia do poeta Manuel Bandeira
Manuel Bandeira

Seus poemas trazem as temáticas e traços do Modernismo de 1ª Geração e também é marcada por aspectos autobiográficos. A infância feliz e saudável em Recife, o amor e o erotismo, a solidão e a morte, que tornou-se sua companheira desde os dezessete anos.

Vou-me embora pra Pasárgada

Lá sou amigo do rei

Lá tenho a mulher que eu quero

Na cama que escolherei

Vou-me embora pra Pasárgada

Vou-me embora pra Pasárgada

Aqui eu não sou feliz

Lá a existência é uma aventura

De tal modo inconseqüente

Que Joana a Louca de Espanha

Rainha e falsa demente

Vem a ser contraparente

Da nora que nunca tive

(…)”

Sua poesia caracteriza-se pela influência da melancolia simbolista, pela presença dos versos redondilhos e da cultura popular, mas também pelas propostas dos primeiros modernistas, como os versos livres, a coloquialidade e a metalinguagem.

Estou farto do lirismo comedido

Do lirismo bem comportado

Do lirismo funcionário público com livro de ponto espediente protocolo e manifestações de apreço ao [sr. diretor.

(…)”

Apesar da doença, Bandeira viveu bastante e deixou 11 livros de poesia e vários livros de crônica e crítica literária.

Resumindo…

  • As obras da 1ª Geração do Modernismo brasileiro ocorreram em um período conturbado e de grandes mudanças;
  • Após a Semana de Arte Moderna, os modernistas se dividiram em dois grupos: o grupo da Anta, formados por escritores nacionalistas radicais e o grupo da Antropofagia, liderados por Oswald de Andrade e que acreditavam em uma arte que falasse do Brasil sem negar a influência estrangeira;
  • A 1ª Geração do Modernismo produziu obras que se caracterizaram pela renovação da linguagem através da oralidade, coloquialidade e prosaísmo e por uma investigação crítica de nossa identidade nacional;
  • Os principais escritores dessa geração foram Oswald de Andrade, Mário de Andrade e Manuel Bandeira;
  • Oswald de Andrade produziu uma poesia marcada pela reflexão crítica de nossa nacionalidade e por uma crítica ferina à burguesia, principalmente paulistana, revelada em Memórias Sentimentais de João Miramar;
  • Mário de Andrade foi um apaixonado pela cidade de São Paulo e pelo folclore nacional. Ambos temas de suas obras em verso e em prosa;
  • Macunaíma, romance de Mário de Andrade, é uma das principais obras da literatura brasileira. Configura-se como uma paródia dos romances indianistas românticos, principalmente Iracema, de José de Alencar. Além disso, Mário procurou construir através do anti-herói Macunaíma um perfil do brasileiro, marcado pela ambiguidade e pela malandragem;
  • Manuel Bandeira é o poeta mais lírico (emotivo) dos três. Sua poesia é marcada pela alegria e liberdade da infância, pelo erotismo e pelo amor, pela solidão e pela presença constante da morte.

Conclusão

O Modernismo, em sua 1ª Geração, marcou-se pela renovação da linguagem literária e pela reflexão crítica da nacionalidade brasileira.

São características dessa geração o verso livre, a oralidade e a coloquialidade, o prosaico (o comum, os fatos banais do cotidiano), a metalinguagem (a reflexão sobre a própria escrita e literatura), e o questionamento sobre o que caracteriza o brasileiro, ao refletir sobre a nossa formação enquanto povo.

Essa geração foi muito importante, pois rompeu com a tradição e trouxe para a arte brasileira uma linguagem e uma expressão mais moderna e reflexiva. Também mostrou a importância de nossa própria cultura e de nossa identidade enquanto povo.

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