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Literatura de cordel: o que é, origem, características e principais autores

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A literatura de cordel é uma produção literária muito presente no Norte e Nordeste do Brasil. De origem medieval, ela é caracterizada por ser uma narrativa em verso de temas e linguagem populares.

Veja neste post o que é a literatura de cordel, sua origem, principais características e exemplos.

O que é literatura de cordel?

A literatura de cordel é uma forma de poesia muito comum no Norte e no Nordeste do Brasil. Essa poesia é escrita em pequenos livros que são encontrados em feiras e outros eventos populares geralmente expostos em cordas ou varais.

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Essa poesia narra histórias conhecidas pelo povo, muitas delas protagonizadas por heróis regionais ou nacionais. Além do caráter heróico e histórico, as histórias também falam de temas relacionados ao cotidiano popular e aos problemas sociais.

Dessa forma, a literatura de cordel assume um caráter político e documental, sendo de grande importância cultural e social. Ela registra eventos e demonstra como as pessoas da região e da época vêem os fatos e a cena social.

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Origem da literatura de cordel

A literatura de cordel surgiu no final da Idade Média em Portugal. Lá, ela mantinha a tradição trovadoresca, os versos redondilhos e descrição de ambientes e costumes populares. Os versos já se apresentavam em redondilhos, ou seja, em geral, com 7 sílabas métricas.

Vários folhetos de cordel nas mãos de uma pessoa

O hábito de essas histórias em verso serem vendidas em pequenos livros que eram pendurados em cordas nas feiras populares também vem de Portugal. Daí, depois, o fato de essa literatura ter sido chamada de cordel, ou literatura de cordel.

Assim, em relação ao Brasil, a literatura de cordel é uma herança da cultura portuguesa. Ela chegou ao Brasil no século XVIII. No século XIX, os folhetos dos cordelistas começaram a ser impressos e chegaram a um público mais amplo.

Ao cordel brasileiro foi associada a xilogravura, desenhos impressos manualmente nos folhetos para ilustrar as histórias.

Características da literatura de cordel

São características do cordel brasileiro:

  • história narrada em verso redondilho, em geral, de sete sílabas métricas e rimado;
  • apresenta ritmo bem marcado, é comum os vendedores de cordel aproveitarem esse ritmo para cantar os versos nas feiras, chamando o público;
  • as histórias são marcadas por aventuras, grandes amores e feitos heróicos, é comum encontrarmos cordéis sobre personagens históricas de importância para a região, como Lampião e Getúlio Vargas;
  • pode tratar também de temas mais simples, situações comuns do cotidiano em que o humor e a ironia são elementos marcantes e agradam muito ao público;
  • por causa do humor e da ironia, e também pela crítica social que podem apresentar, as histórias dos cordéis podem ser caracterizadas como satíricas;
  • têm caráter documental, histórico, político e social, servindo como registro de eventos sociais e históricos e também como veículo de crítica e denúncia de problemas que afetam o povo;
  • traços folclóricos, tanto nos temas e personagens das histórias como no modo como são contadas, ou seja, em sua estrutura;
  • linguagem popular e marcada pela oralidade e por expressões regionais, o que aproxima essa literatura ainda mais do povo, seu principal público consumidor;
  • tem caráter regional, sendo característica da cultura nordestina, ainda que esteja presente em outras regiões do Brasil;
  • opõe-se à tradição culta, tanto em sua forma quanto em sua linguagem;
  • por serem vendidas, em muitas ocasiões, nas feiras penduradas em cordas, receberam o nome de cordel.

Cordel versus repente

A literatura de cordel e o repente, às vezes, podem ser entendidos como complementos ou sinônimos um do outro, mas não são. São expressões artísticas diferentes.

Enquanto o cordel é uma produção em versos escrita e publicada em folhetos, o repente é produzido de improviso e recitado. É verdade que o cordel também pode ser recitado e mesmo cantado, mas, nesse caso, foi escrito com antecedência.

O repente é uma improvisação de versos e geralmente ocorre na forma de desafios. Ou seja, dois poetas se enfrentam e elaboram versos ali, no momento em que se encontram.

Xilogravura com dois violeiros cantadores.

Essa forma de fazer poesia tem aproximações hoje com o rap e as batalhas que ocorrem nas ruas de grandes cidades e reúnem muitos jovens. Pode ser vista como uma revitalização da tradição medieval que o cordel e o repente carregam.

Principais autores da literatura de cordel

Desde o seu surgimento no Brasil, a literatura de cordel foi produzida por muitos autores. Eles são conhecidos como cordelistas e estima-se que haja no Brasil hoje mais de 4000 poetas em atividade.

Dentre os que se destacaram, desde o começo do cordel aqui, estão Leandro Gomes de Barros, João Martins de Athayde, José Alves Sobrinho, Manoel Monteiro, Patativa do Assaré, entre outros.

Leandro Gomes de Barros

Leandro Gomes de Barros nasceu no Nordeste, em 1865, e é considerado o maior poeta popular do Brasil. Escreveu aproximadamente 240 poemas e tem três milhões de livros vendidos.

Seus poemas são inspirados em narrativas medievais, as chamadas novelas de cavalaria, como as do Ciclo Carolíngio ou Matéria de França. A Batalha dos Oliveiros contra Ferrabrás é um exemplo disso.

Nós temos cinco governos
O primeiro o federal
O segundo o do Estado
Terceiro o municipal
O quarto a palmatória
E o quinto o velho punhal

O punhal e a palmatória

As obras de Leandro Gomes de Barros inspiraram muitos autores posteriores a ele. Um exemplo é Ariano Suassuna que incluiu em sua peça O Auto da Compadecida dois poemas de Leandro, O testamento do cachorro e O cavalo que defecava dinheiro.

João Martins de Athayde

João Martins de Athayde nasceu na Paraíba em 1880. É um dos cordelistas que mais contribuiu para a difusão da literatura de cordel no Brasil durante o século XX.

João Grilo foi um cristão
que nasceu antes do dia
criou-se sem formosura
mas tinha sabedoria
e morreu depois da hora
pelas artes que fazia.

As proezas de João Grilo

Foi editor de cordéis e imprimia seus folhetos com inspirações no cinema americano. Suas obras apresentam um estilo jornalístico e irônico e caracterizam-se como crônicas dos costumes da época.

José Alves Sobrinho

Paraibano, José Alves Sobrinho nasceu em 1921. Foi poeta, cordelista, repentista e pesquisador da cultura popular. Era um mestre na arte da cantoria e teve programas de poesia popular em diversas rádios do Nordeste.

Escreveu obras como Quem matou também morreu, em que fala sobre Lampião que tinha morrido pouco antes, Lampião e Zé Saturnino, Sabedoria de Caboco, Matulão de um andarilho, entre outros.

Eu também fui cantador
Repentista e violeiro,
Todo o norte brasileiro
Inda lembra, sim senhor,
O meu nome, o meu valor,
A minha voz estridente,
Porém, repentinamente,
A mão do destino atroz
Arrebatou minha voz.
Deixei de cantar repente

Quando eu deixei de cantar

Destacou-se como repentista e como pesquisador da cultura popular nordestina. Suas obras nessa área são importantes para o estudo da cultura popular tanto no Brasil como também na Europa.

Manoel Monteiro

Manoel Monteiro nasceu na Paraíba em 1937. Trabalhou a maior parte de sua vida em Campina Grande, cidade considerada a capital do cordel. Produziu mais de 150 obras e é visto como um dos grandes cordelistas do Brasil no século XX.

Em que eu nasci e andei
Após uso da razão
A poesia abracei
E saí vendendo versos
Na Paraíba aportei.

Peleja de Manoel Camilo com Manoel Monteiro

Escreveu narrativas envolventes, capazes de manter a atenção do leitor do início ao fim, e com as características próprias do cordel. São exemplos Lampião: herói de meia tigela e O maior São João do mundo completa 30 anos.

Patativa do Assaré

Antônio Gonçalves da Silva, ou Patativa do Assaré, nasceu em Assaré, no Ceará, em 1909. De família pobre do meio rural, ainda menino ficou cego do olho direito como sequela do sarampo. Trabalhou na lavoura e, aos doze anos, já era repentista.

Capa de um cordel de Patativa do Assaré

Frequentava a Feira do Crato onde cantava os seus poemas. Também participava de programas de rádio, declamando seus poemas. Foi assim que conseguiu publicar seu primeiro livro, Inspiração Nordestina, em 1956, depois reentitulado Cantos do Patativa.

Tornou-se conhecido nacionalmente, sendo um dos poetas da literatura de cordel mais popular no Brasil. Outras obras conhecidas do poeta são Cante lá que eu canto cá, Ispinho e Fulô e Aqui tem coisa.

A terra é um bem comum
Que pertence a cada um.
Com o seu poder além,
Deus fez a grande Natura
Mas não passou escritura
Da terra para ninguém.
 
Se a terra foi Deus quem fez,
Se é obra da criação,
Deve cada camponês
Ter uma faixa de chão.

A terra é nossa

A poesia de Patativa do Assaré é fortemente marcada pela oralidade. Ele guardava os versos de memória e os preparava assim antes de recitá-los. Seus temas abordam fatos da história do Nordeste e personagens marcantes como o beato Antônio Conselheiro.

A literatura de cordel e a obra de escritores nordestinos contemporâneos

A literatura de cordel inspirou muitas obras de nossa literatura produzidas durante o século XX. Já mencionamos neste artigo a obra de Ariano Suassuna, por exemplo. Mas podemos ver a presença do cordel na obra de outros escritores ainda mais atuais, como Bráulio Bessa e Jarid Arraes.

Bráulio Bessa

Braúlio Bessa é um poeta cearense nascido em 1985. É conhecido em todo o Brasil graças a seu trabalho na televisão e nas redes sociais da internet. Seus vídeos ultrapassam 250 milhões de visualizações e levam poesia a milhares de pessoas todos os dias.

Quando a vida bater forte
e sua alma sangrar,
quando esse mundo pesado
lhe ferir, lhe esmagar…
É hora do recomeço.
Recomece a LUTAR.
 
Quando tudo for escuro
e nada iluminar,
quando tudo for incerto
e você só duvidar…
É hora do recomeço.
Recomece a ACREDITAR.

Recomece

Escreveu livros como Poesia com rapadura e Poesia que transforma, ambos de grande sucesso. Seus poemas falam de temas como superação, autoestima e empatia e são marcados pela métrica e a rima típicas da literatura de cordel.

Jarid Arraes

Jarid Arraes também é cearense e nasceu em 1991. É escritora, cordelista e poeta. Suas obras falam sobre a figura feminina, principalmente sobre mulheres negras e sua invisibilidade histórica.

Para quem não compreende
Me disponho a explicar
O problema do racismo
Que a tudo quer mudar
O cabelo é o primeiro
E também o derradeiro
Que o racismo quer barrar.
Nesse mundo de racismo
Tudo é padronizado
O cabelo é escorrido
Natural ou alisado
E o cabelo cacheado
Que acaba repudiado

Quem tem crespo é rainha

Pertencente a uma família de cordelistas e xilogravadores, Jarid tem mais de 70 títulos em cordel. Escreveu ainda em outros gêneros de poesia e também romances e contos. Suas obras mais conhecidas são As lendas de Dandara e Heroínas negras brasileiras em 15 cordéis.

Conclusão

A literatura de cordel tem forte tradição no Nordeste brasileiro e é também produzida em outras partes do país. São histórias de cunho popular narradas em versos redondilhos maiores.

O cordel tem esse nome devido ao modo como os folhetos com a poesia é comercializada. As obras são penduradas em cordas nas feiras populares do Nordeste.

O cordel foi introduzido no Brasil no século XVIII mas ganhou maios popularidade durante o século XX. Alguns escritores destacam-se nacionalmente como Patativa do Assaré e, hoje, Bráulio Bessa.

Samira Mór é formada em Letras pela UFJF e Mestra em Literatura pela mesma instituição. É também professora das redes pública e privada há mais de trinta anos. Apaixonada por palavras e livros desde sempre, seu objetivo é partilhar com as pessoas o amor pela leitura e pelos livros.

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