O livro Gabriela, cravo e canela é uma das obras mais conhecidas e amadas de Jorge Amado.
Publicado em 1958, o romance nos transporta para Ilhéus, na Bahia, durante os anos de 1925 a 1930, e retrata o processo de modernização dessa cidade em que o progresso chega para suplantar o coronelismo e o autoritarismo de uma sociedade patriarcal.
Assim, com uma trama envolvente e personagens cativantes, a obra aborda questões sociais e culturais que ainda são muito relevantes nos dias de hoje.
“Só Gabriela parecia não sentir a caminhada, seus pés como que deslizando pela picada muitas vezes aberta na hora a golpes de facão, na mata virgem. Como se não existissem as pedras, os tocos, os cipós emaranhados. A poeira dos caminhos da caatinga a cobrira tão por completo que era impossível distinguir seus traços. Nos cabelos já não penetrava o pedaço de pente, tanto pó se acumulara. Parecia uma demente perdida nos caminhos. Mas Clemente sabia como ela era deveras e o sabia em cada partícula de seu ser, na ponta dos dedos e na pele do peito. Quando os dois grupos se encontraram, no começo da viagem, a cor do rosto de Gabriela e de suas pernas era ainda visível e os cabelos rolavam sobre o cangote, espalhando perfume. Ainda agora, através da sujeira a envolvê-la, ele a enxergava como a vira no primeiro dia, encostada numa árvore, o corpo esguio, o rosto sorridente, mordendo uma goiaba”.
(Jorge Amado. Gabriela, cravo e canela.)
Enredo de Gabriela, cravo e canela
A história gira em torno de Gabriela, uma jovem e bela retirante sertaneja que chega a Ilhéus em busca de trabalho.
Sua chegada desperta a atenção de Nacib, dono do bar Vesúvio, que decide contratá-la como cozinheira. Gabriela, com sua beleza exuberante e sua personalidade cativante, conquista a todos na cidade, tornando-se uma figura icônica.
Além disso, a moça é uma excelente cozinheira e seu tempero atrai muita clientela para o bar Vesúvio.
“Na pobre cozinha, Gabriela fabricava riqueza: acarajés de cobre, abarás de prata, o mistério de ouro do vatapá”.
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Personagens cativantes e inesquecíveis
Além de Gabriela e Nacib, outros personagens marcantes povoam as páginas do livro.
Tonico Bastos, tabelião da cidade, homem mulherengo e metido a conquistador, aparentemente amigo de Nacib, é um dos principais antagonistas da trama.
Outra personagem interessante é Sinhazinha, esposa do coronel Jesuíno, homem rude e violento. Sinhazinha é uma mulher elegante e submissa ao marido, ainda que este a maltrate constantemente.
Ela, então, conhece o dentista Osmundo por quem se apaixona. Mas a paixão acaba em tragédia, quando Jesuíno descobre a traição e mata a mulher e o amante.
Também desempenhando um papel importante na narrativa, há ainda o coronel Ramiro Bastos, figura que incorpora o atraso e o conservadorismo da sociedade cacaueira.
Cenário marcante e questões sociais relevantes
Um dos aspectos mais marcantes de Gabriela, cravo e canela é a sua ambientação na Bahia.
O livro retrata com riqueza de detalhes a cultura, a culinária e o modo de vida do povo baiano. A cidade de Ilhéus, com sua atmosfera tropical, suas praias paradisíacas e seus costumes peculiares, ganha vida nas páginas da obra.
Jorge Amado utiliza uma linguagem rica e colorida para descrever os cenários, transportando o leitor para esse universo tão característico.
Além da ambientação, o livro também aborda questões sociais relevantes.
A obra retrata a realidade da época, marcada pela exploração do cacau e pelas desigualdades sociais.
A figura de Gabriela, uma mulher livre e sensual, desafia as convenções da sociedade conservadora. Através da personagem Gabriela, Jorge Amado discute temas como o machismo, a opressão e a busca pela liberdade.
Quem foi Jorge Amado
Jorge Amado nasceu em 1912, em Itabuna, Bahia.
Ao longo de sua carreira, ele se tornou um dos mais importantes escritores brasileiros, conhecido por suas obras que retratam a cultura e as questões sociais do país.
Além de romancista, Jorge Amado também foi político, tendo sido eleito deputado federal pelo Partido Comunista Brasileiro. Ocupou a cadeira 23 na Academia Brasileira de Letras, recebeu diversos prêmios e um dos mais altos títulos do Candomblé, sua religião, o Obá Oloru.
Jorge Amado escreveu mais de trinta livros ao longo de sua vida, sendo Gabriela, cravo e canela um dos mais populares.
A obra, publicada em 1958, recebeu o prêmio Machado de Assis e o prêmio Jabuti, ambos logo no ano seguinte.
Sua escrita envolvente, repleta de personagens carismáticos e tramas cativantes, conquistou leitores de todas as idades.
Além disso, esse romance inaugura uma nova fase na escrita do autor, antes marcada pelo forte combate político e a denúncia contundente de mazelas sociais.
A partir de Gabriela, cravo e canela, seus romances trazem aspectos mais líricos e figuras femininas sensuais em busca de liberdade de ser e de viver.
O autor faleceu em 2001, deixando um legado literário que continua a encantar gerações.
Obra-prima da literatura brasileira
Em suma, Gabriela, cravo e canela é uma obra-prima da literatura brasileira que nos transporta para a Bahia dos anos 1920.
Com uma trama envolvente, personagens cativantes e uma ambientação rica em detalhes, o livro nos convida a refletir sobre questões sociais e culturais.
A obra tornou-se novela da tv Tupi, em 1961, e da Rede Globo, em 1975, com remake em 2012 também, demonstrando a forte propensão das obras de Jorge Amado para a linguagem da teledramaturgia.
A trama do famoso romance de Jorge Amado também ganhou as telonas com o filme de Bruno Barreto, em 1983.
Com sua escrita única e sua aguda visão de mundo, Jorge Amado nos presenteia com uma obra que transcende o tempo e continua a encantar leitores ao redor do mundo.
“O perfume de cravo enchia o quarto, um calor vinha do corpo de Gabriela, envolvia Nacib, queimava-lhe a pele, o luar morria na cama. Num sussuro entre beijos, a voz de Gabriela agonizava:
– Moço bonito…”
(Jorge Amado. Gabriela, cravo e canela.)
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